terça-feira, 13 de julho de 2010

Os milagres de Jesus, segundo o Espiritismo

Curas de cegos e paralíticos, ressurreições e outros fenômenos extraordinários pontuam a narrativa dos Evangelhos, mas suas causas são naturais e podem ser compreendidas com a ajuda da ciência espírita

Texto inédito
Por Rita Foelker

Ao lado: Santas mulheres no sepulcro (1890), por William A. Bouguereau

Os milagres intrigam. Costumam parecer inexplicáveis e levam a supor que aqueles que os obtêm possuem algum poder sobrenatural. Para o Espiritismo, porém, nada existe de sobrenatural, isto é, nada pode estar acima das leis de Deus, que são todas leis da Natureza.
Como encontrar, então, uma forma racional e científica de compreender tantos fenômenos narrados nos Evangelhos, como a pesca maravilhosa, as curas diversas, a ressurreição de Lázaro?
De fato, existem duas chaves simples para esse entendimento: uma delas é a compreensão de quem é Jesus e, a outra, refere-se às propriedades daquilo que a Codificação chamou de fluidos. Vamos conhecer estas chaves para depois aplicá-las a alguns eventos tidos como milagrosos, no intuito de entender como funcionam.

O fluido calórico e os fluidos espirituais

A ciência resolveu muitos enigmas relacionados às forças consideradas sobrenaturais, como a explicação para os eclipses, por exemplo, que por muito tempo foram considerados eventos mágicos.
Para os fenômenos em que a ação do elemento espiritual é decisiva, porém, precisamos buscar o entendimento das leis que regem a vida psíquica.
Nos diálogos com os Espíritos, Allan Kardec fazia perguntas baseado nas ciências de sua época. Na Física, a teoria aceita para explicar o calor nos séculos XVIII e XIX, era a do fluido calórico. Tratava-se de uma suposta substância transmitida pelos corpos quentes aos mais frios. A idéia de fluido predominava também na compreensão de outros fatos: a eletricidade era a transmissão de fluido elétrico, o imã emitia o fluido magnético, e assim por diante.
Já por volta de 1860, o físico escocês James C. Maxwell propôs que o calor seria um estado de vibração das moléculas, idéia que viria a substituir a do fluido calórico. Os Espíritos, porém, só podiam explicar seus conceitos a partir do que os homens compreendiam por suas ciências. Na época, o que havia na Física eram os fluidos. Os Espíritos explicaram, então, que toda a matéria que conhecemos, e também a matéria imponderável do mundo espiritual, eram transformações de uma só origem, chamada de fluido cósmico universal, a matéria elementar primitiva que se formou no início do Universo e originou todos os corpos e substâncias, sejam eles perceptíveis ou não pelos sentidos materiais.
No seu estado etéreo, que não é detectado por nossos instrumentos, nas suas propriedades e nas suas inúmeras modificações, encontramos o agente de fenômenos que comumente se consideram milagrosos ou sobrenaturais.
Diferente da matéria que conhecemos, eles mudam de forma, se expandem e se contraem ao influxo dos pensamentos, emoções e sentimentos. Há fluidos (a partir daqui chamaremos “fluidos” as substâncias do mundo espiritual) calmantes, excitantes, prejudiciais e benéficos de tantos tipos quantos forem os pensamentos, emoções e sentimentos a eles associados. E a matéria densa, aquela que impressiona os cinco sentidos, não é obstáculo para eles, pois que a atravessam.
Os fluidos permitem a transmissão de pensamentos, sentimentos e emoções entre os Espíritos. No mundo material, uma de suas aplicações mais importantes está relacionada à cura. No mundo espiritual, eles têm para os Espíritos em geral uma aparência tão palpável quanto os nossos objetos do dia-a-dia. No entanto, os que são mais esclarecidos conseguem compreender seu papel, bem como usar suas propriedades para seus propósitos.
Um dos produtos mais importantes derivados dos fluidos é o perispírito, ou o corpo espiritual que todos os Espíritos possuem, o qual também é considerado seu “órgão sensitivo”, responsável pelas sensações que experimenta. O perispírito de um ser encarnado é ligado ao seu organismo molécula a molécula, desde a concepção e enquanto perdurar a vida física, e sua constituição íntima não é idêntica em todos os seres, variando conforme os mundos onde se encontre e a evolução atingida.
Não há, ainda hoje, meios de observação e nem mesmo uma teoria plausível para conceber a matéria do mundo espiritual. Todavia, as explicações dos Espíritos sobre suas propriedades, condições e efeitos são válidos e constituem a base teórica da Ciência Espírita

Jesus, um Espírito superior

O Livro dos Espíritos nos diz que Jesus é o Espírito mais elevado que já encarnou em nosso planeta. Sendo assim, não seria de estranhar-se que realizasse prodígios. Sua superioridade moral e a amplitude de seus conhecimentos das leis naturais tornaria possível fazer coisas que são impossíveis para o nível evolutivo médio da Humanidade terrena. Sobre ele, afirma A Gênese: “A sua superioridade com relação aos homens não derivava das qualidades particulares do seu corpo, mas das do seu Espírito, que dominava de modo absoluto a matéria e da do seu perispírito, tirado da parte mais quintessenciada dos fluidos terrestres. Sua alma, provavelmente, não se achava presa ao corpo, senão pelos laços estritamente indispensáveis. Constantemente desprendida, ela decerto lhe dava dupla vista, não só permanente, como de excepcional penetração e muito superior à que de ordinário possuem os homens comuns. O mesmo havia de dar-se, nele, com relação a todos os fenômenos que dependem dos fluidos perispirituais ou psíquicos. A qualidade desses fluidos lhe conferia imensa força magnética, secundada pelo incessante desejo de fazer o bem.”

Dupla vista

A dupla vista – ou segunda vista – é um fenômeno descrito em O Livro dos Espíritos que permite ver objetos ausentes como se estivessem presentes e também penetrar nos pensamentos e intenções de outras pessoas ou Espíritos quando se está plenamente acordado. É uma faculdade que se explica pelo fato da visão da alma não ser circunscrita ao corpo físico e não ter localização determinada. Sendo o perispírito o seu órgão dos sentidos, e sendo os fluidos expansíveis e capazes de atravessar a matéria densa, disso decorre que um Espírito pode ter percepções à distância ou através de corpos opacos conforme seja capaz de expandir seus fluidos perispirituais.
A capacidade da dupla vista explica fatos como a pesca maravilhosa e a aceitação imediata e espontânea dos apóstolos ao convite de Jesus para a tarefa de espalhar a Boa Nova.
Conta Mateus que, passando pelas margens do Mar da Galiléia, Jesus encontrou Simão Pedro juntamente com seu irmão André, ocupados em seus afazeres de pescadores. Foi quando lhes fez o célebre chamado, para que o acompanhassem e se tornassem “pescadores de homens”, e eles então deixaram as redes e o pai e o seguiram. Como isso foi possível? Ora, em várias passagens lemos a expressão “Jesus, conhecendo-lhes os pensamentos...”, o que ocorria porque Jesus conseguia perceber as irradiações desses pensamentos. Ao dirigir-se a Simão e André, o mestre galileu já conhecia suas disposições mais íntimas e sabia que eles o seguiriam.
Dentre os feitos narrados nos Evangelhos, encontramos também outro exemplo de dupla vista: a pesca maravilhosa. Narra o evangelista Lucas que após falar ao povo que se comprimia às margens do lago de Genesaré, Jesus disse a Simão Pedro que levasse seu barco para o mar e lançasse suas redes. Pedro então respondeu-lhe que por toda a noite haviam feito isso, sem nada conseguir. Obedecendo, no entanto, ao Mestre, entrou no mar e conseguiu apanhar tantos peixes que a rede se rompeu.
Kardec explica que “Jesus não produziu a presença peixes onde não os havia; mas que ele viu, com a vista da alma, (...) o lugar onde se achava o cardume e por isso disse com segurança aos pescadores que lançassem ali suas redes”.
A segunda vista explica igualmente a atitude de Jesus perante o beijo de Judas e, na sua entrada em Jerusalém, uma semana antes de sua crucificação, que ele houvesse mandado buscar o jumentinho em um local específico da cidade, a fim de conduzi-lo.

Libertações e ressurreições

Importantes passagens da vida de Jesus narram a libertação de possessos ou endemoniados.
Fala-se no Evangelho de Marcos de um possesso cego e mudo que foi apresentado a Jesus por um grupo, em Cafarnaum, e há também caso do menino endemoniado que espumava e convulsionava e que desmaiou ao ser abandonado pelo obsessor, além de outros mais.
Possessão é um termo que leva a imaginar erroneamente que um ser pode “tomar posse” do corpo de um encarnado e usá-lo a bel-prazer, o que não ocorre de fato. O que ocorre é que um Espírito inferior se identifica fortemente com um outro, encarnado, cujos defeitos e qualidades sejam os mesmos que os seus, a fim de atuar conjuntamente com ele. O encarnado, nesse caso, é sempre quem atua, conforme quer, sobre seu corpo, pois um Espírito não pode substituir-se ao que está encarnado, visto que este terá que permanecer ligado ao seu corpo até o final de sua existência material.
Acresce também que, embora se fale em demônios, criaturas especialmente voltadas a praticar o mal, conforme o senso comum, tratava-se, na verdade, de Espíritos perturbadores ou obsessores, que perseguiam pessoas e que, graças à autoridade moral do Mestre, não podiam resistir à sua vontade e tinham de obedecer-lhe, por isso deixavam em paz os seus perseguidos.
As ressurreições também são fatos surpreendentes da narrativa bíblica. Podemos nos recordar da que ocorreu com a filha de Jairo e também da de Lázaro.
Ao falar em ressurreição, logo pensamos na restituição da vida a quem estava realmente morto, o que seria contrário às leis da natureza. Isso não poderia ocorrer, pois o Espírito que se liga ao corpo no momento da concepção com ele permanece até a morte, não havendo outro jeito de religar posteriormente ao corpo uma alma que dele estivesse totalmente separada. Algumas situações, porém, levam à aparência de morte física, mesmo que o Espírito ainda esteja ligado ao organismo. Lembremos ainda que, à época em que estes fatos ocorreram, era comum interpretar que a ausência de respiração fosse um sinal de morte. No entanto, ao referir-se à filha de Jairo, por exemplo, o próprio Jesus afirma que ela “dorme” apenas, de forma que consegue reanimá-la pelo poder vital de seus fluidos.
Quanto a Lázaro, que estaria sepultado já há quatro dias, compreende-se que ele não estava propriamente morto, mas letárgico. Letargia é um estado de desprendimento do Espírito de seu corpo associado à perda temporária e completa da sensibilidade e do movimento. Lê-se em A Gênese: “Dado o poder fluídico que Jesus possuía, nada de espantoso há em que esse fluido vivificante, acionado por uma vontade forte, haja reanimado os sentidos em torpor; que haja mesmo feito voltar ao corpo o Espírito, prestes a abandoná-lo, uma vez que o laço perispirítico ainda se não rompera definitivamente”.

Curas diversas

As curas são momentos marcantes da missão de Jesus, explicadas pelas propriedades terapêuticas dos fluidos. Embora comumente se pense na fé como uma virtude mística ou religiosa, trata-se de uma força real e atrativa, que age sobre os fluidos e lhes imprime potencialidades curativas.
O apóstolo Marcos nos conta que ao chegar a Betsaida, pediram ao Mestre que tocasse um cego, que ele o tomou pela mão e o levou para fora da vila. Após passar saliva em seus olhos, perguntou-lhe se via alguma coisa, ao que ele respondeu: “Vejo a andar homens que me parecem árvores.”. – Jesus lhe colocou de novo as mãos sobre os olhos e ele conseguiu ver melhor, até ficar perfeitamente curado.
Kardec observa: “Aqui, é evidente o efeito magnético; a cura não foi instantânea, porém gradual e consequente a uma ação prolongada e reiterada, se bem que mais rápida do que na magnetização ordinária. A primeira sensação que o homem teve foi exatamente a que experimentam os cegos ao recobrarem a vista. Por um efeito de óptica, os objetos lhes parecem de tamanho exagerado.” Sendo efeito de leis naturais explicadas pelo Magnetismo Animal, esta mesma forma de curar se repetiria com Mesmer e seus seguidores, no século XVIII.
Para quem acredita que Jesus era especial apenas em função das curas e outros fatos excepcionais que pontuaram sua encarnação terrena, o Espiritismo responde que a verdadeira superioridade de seu Espírito transparece, não nos fatos extraordinários a que deu causa, mas na excelência dos seus ensinos e na doutrina moral que eles transmitem. Escreve o Codificador: “Diante desse código divino, a própria incredulidade se curva. É terreno onde todos os cultos podem reunir-se, estandarte sob o qual podem todos colocar-se (...). Para os homens, em particular, constitui aquele código uma regra de proceder que abrange todas as circunstancias da vida privada e da vida pública, o principio básico de todas, as relações sociais que se fundam na mais rigorosa justiça. E, finalmente e acima de tudo, o roteiro infalível para a felicidade.”


Jesus ensinou a seus discípulos o poder da fé

As curas pelo magnetismo são fatos submetidos às leis da Natureza. E a fé surge como elemento decisivo na cura, como no caso do menino obsediado, que foi apresentado aos seus discípulos e eles não puderam curá-lo. Segundo nos conta Mateus, Jesus, teria dito: “Ó geração incrédula e perversa! Até quando estarei eu convosco, e até quando vos sofrerei? Trazei-mo aqui.” Tendo sido libertado do Espírito obsessor e da doença, o menino sarou. Os discípulos, procurando o Mestre em particular, indagaram: “Por que não pudemos nós expulsá-lo? E Jesus lhes disse: Por causa de vossa pouca fé; porque em verdade vos digo que, se tiverdes fé como um grão de mostarda, direis a este monte: Passa daqui para acolá, e há de passar; e nada vos será impossível.”


Agradecimento Especial
Ao meu amigo Paulo Henrique de Figueiredo, com quem as muitas conversas sobre a ciência espírita e o Magnetismo Animal ajudaram a produzir este texto.

11 comentários:

  1. Excelente texto, que vai me ajudar para a aula que darei sobre este assunto no centro espírita onde trabalho. Muito bom!!

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  2. Excelente texto, que vai me ajudar para a aula que darei sobre este assunto no centro espírita onde trabalho. Muito bom!!

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  3. Interessante! Muito bem explicado e de fácil entendimento. Obrigada!!!

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  4. Interessante! Muito bem explicado e de fácil entendimento. Obrigada!!!

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  5. Excelente aula de Ciência e Filosofia. Parabéns

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  6. Excelente. Direto, didático e sem alegorias.

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  7. Excelente. Muito esclarecedor. Estarei utilizando-o em momento de estudo do grupo espírita que participo.

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  8. Acredito que os milagres na época de Cristo foram extraordinários e foram necessários para o povo de sua época e para servir de pilar para os seus apóstolos, depois dele nada foi feito em igual magnitude.

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  9. Tema complexo,toda explicação muito boa,mas tudo não passa de teoria. Não sabemos nadica de nada.

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