sexta-feira, 29 de novembro de 2013

A química dos relacionamentos*

Como a vida social desperta atitudes melhores... ou não!
Telhados de BedZed, vila sustentável na Inglaterra.

Por Rita Foelker

A vida social tem uma razão de ser, assim como os relacionamentos humanos. Entre chefe e subordinado, pais e filhos, professor e aluno, entre irmãos, colegas, familiares, vizinhos, amigos, quer seja em duplas, trios ou grupos, encontraremos um propósito que atende à evolução de cada espírito neles envolvido.
Carl Gustav Jung (1875-1961) escreveu em A prática da psicoterapia (Vozes) que “o encontro de duas personalidades assemelha-se ao contato de duas substâncias químicas: se alguma reação ocorre, ambos sofrem uma transformação”.
As reações “químicas” geradas são únicas. Tão únicas que não é difícil perceber que somos diferentes com pessoas diferentes. Algumas parecem despertar nosso melhor; outras acessam nosso pior. Perto de algumas, sentimo-nos afetivos, criativos, expansivos. Outras nos fazem sentir pouco inteligentes, retraídos e inadequados.
As relações humanas dependem do que cada participante conduz para dentro delas, proveniente de sua psicologia, ética, moral, sentimento, vontade, intelecto, intenções, interesses, vivências, expectativas, cultura, valores. Elas podem ser saudáveis ou doentias, agradáveis ou desagradáveis, sinceras ou enganosas, satisfatórias ou frustrantes, numa vasta gama de variações. Por isso é tão importante conviver, para aprendermos com essas diferenças.
O livro dos espíritos não deixa dúvida, na questão 766: “Deus fez o homem para viver em sociedade. Deus deu-lhe a palavra e todas as demais faculdades necessárias ao relacionamento”. No entanto, o que conduzimos para cada espaço que adentramos? Qual consideramos ser a nossa parcela de contribuição para o meio onde nos encontramos? E o que assimilamos nesse convívio?

De ecovilas a casais

Quando uma comunidade se forma, soma-se mais que as características pessoais de cada integrante. Formam-se vínculos, baseados em normas de conduta, expectativas, objetivos. Isso é nítido ao se visitar diferentes culturas ou comunidades alternativas. Um exemplo interessante são as vilas sustentáveis, como BedZED (sigla que corresponde a Beddington Zero Energy Development, ou “Desenvolvimento com Energia Zero em Beddington”), em Hackbridge, e Container City II, em Trinity Buoy Wharf, ambos em Londres, Inglaterra. As pessoas escolhem morar nesses lugares porque desejam viver de um modo mais sustentável, e isso implica maneiras específicas de lidar com consumo, água, resíduos e energia. Então, se você vai morar lá, algumas de suas ações e hábitos certamente mudarão, ou você se sentirá inadaptado e terá de sair.
O site de Container City II contém um testemunho de uma moradora: “Nós amamos fazer parte de uma comunidade tão criativa – os clientes adoram a construção e achamos um lugar inspirador para trabalhar”.
Juntar pessoas sempre tem consequências para ambos e no meio onde vivem.
Quando um casal se forma, duas pessoas criam mais que a soma de suas características, pura e simples. Existe uma química nos relacionamentos entre casais, uma química única que resulta das interações de ambos. E não se trata do sentido comum desse termo, mais usado para referir-se à atração sexual.
A convivência e o compartilhamento de situações diversas no cotidiano, onde quer que se encontrem, modifica as pessoas.
Mas o Cristo já havia mencionado esta química dos relacionamentos, ao nos deixar a parábola do fermento. “Não sabeis que um pouco de fermento leveda a massa toda?” escreve Paulo em Coríntios I. Comentando esta passagem do Evangelho, Emmanuel em Fonte viva nos oferece definições oportunas. “O fermento é uma substância que excita outras substâncias, e nossa vida é sempre um fermento espiritual com que influenciamos as existências alheias.” Há referência do autor espiritual a três níveis dessa nossa influência:
Falas. “Nossas palavras determinam palavras em quem nos ouve, e, toda vez que não formos sinceros, é provável que o interlocutor seja igualmente desleal.”
Hábitos. “Nossos modos e costumes geram modos e costumes da mesma natureza, em torno de nossos passos...”
Atos. “Nossas atitudes e atos criam atitudes e atos do mesmo teor, em quantos nos rodeiam, porquanto aquilo que fazemos atinge o domínio da observação alheia, interferindo no centro de elaboração das forças mentais de nossos semelhantes.”
É natural que nossas falas, nossos hábitos e atos surjam da influência que recolhemos no meio onde convivemos, assim como influenciam outras pessoas.  Talvez só falte prestar um tanto mais de atenção ao que expressamos e, também, ao que trazemos do meio compartilhado para nossa vivência diária.

Para saber mais:
- BedZED – Liderando o caminho no desenho de Eco bairros. Site do Programa Cidades Sustentáveis. http://migre.me/fXDoI

- Container City II. Site da Container City (em inglês). http://migre.me/fXCcX

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* Texto publicado na revista Leitura Espírita, Edição 16.

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

As janelas da alma só abrem pelo lado de dentro*

Como agimos perante a nós mesmos?

Por Rita Foelker – Para o site FEAL

Somos seres em transformação. A vida é uma descoberta de potencialidades e uma permanente construção de nós mesmos.

Algumas vezes, partindo de decisões melhores, atingimos o bem-estar e uma condição satisfatória para nosso viver. Decisões menos felizes, em geral, acabam trazendo arrependimentos e dores.

Mas isso não é necessariamente ruim. Olhar para nossos arrependimentos serve para perceber que nos transformamos. Olhar para nossas dores nos mostra que ainda somos frágeis. Aceitá-las, no entanto, ajuda-nos a nos sentirmos fortes e capazes de enfrentá-las.

Uma das leis divinas que nos regem a existência é a Lei de Liberdade. A vida é uma professora que nos permite agir, usar nossa curiosidade e impulsos, experimentar para, e somente então, mostrar seu ensinamento. Não pratica a coação e as proibições, só conduz ao nosso encontro com as consequências naturais, para avaliarmos e calibrarmos nossas futuras ações conforme os ideais de justiça, amor e caridade, que pautam um viver mais elevado.

A vida como professora, porém, não é passiva, pois tem mecanismos para nos despertar: a dor e o arrependimento. Ela nos sinaliza, nos aponta direções, pode inspirar pensamentos, palavras e atos.

O que ela não pode fazer é agir por nós... Porque nossa alma é nosso domínio, é nossa morada, onde ninguém pode chegar sem pedir licença. Então a vida nos chama, bate à janela oferecendo luminosidade e entendimento. Às vezes, com insistência. Às vezes, com muita força. Fazendo “um barulhão”, até, se nosso sono consciencial estiver muito pesado, apontando uma necessidade, uma ideia equivocada, um reflexo indesejável do que pensamos, dissemos ou fizemos, necessitado de premente revisão.

Diante do chamado da vida à responsabilidade, podemos agir como nosso melhor amigo: ouvindo-nos com benevolência, compreendendo, perdoando a nós mesmos, incentivando aos passos necessários para a melhoria. Mas noutras vezes, sem a devida clareza, agimos como nossos próprios julgadores implacáveis, tentando nos eximir da responsabilidade, enquanto nos acusamos, criando batalhas mentais que drenam nossas energias e nos mantêm na escuridão.

Sim, é isso o que acontece. E a frase de Jung nos indica a melhor escolha: “Não conseguimos mudar coisa alguma sem antes aceitá-la. A condenação não libera, oprime.”

A janela da alma só se abre pelo lado de dentro. É preciso querer a luz do entendimento, para que ela venha nos ampliar as condições de lidar com o dia-a-dia, aceitando nosso passado para criar nosso porvir.

Encaremos os fatos: temos uma faixa de atitudes possíveis, entre as que revelam nossa mais alta evolução presente e aquelas que desnudam nossa fragilidade. Quando um amigo em dificuldade nos procura, podemos ouvir com nosso melhor, com a compaixão. Ou com aquela tendência, ainda presente em nós, de julgar e condenar. A questão é: como agiremos perante a nós mesmos?

Na caminhada, é preciso acreditar que somos seres com ilimitada potencialidade. Aprender a olhar para nós mesmos com humildade e compaixão, admitindo a vulnerabilidade e os passos equivocados, encontrando a coragem para criar dias melhores em nossas vidas.

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* Texto publicado no site em 14/11/2013.

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Alguns dentre vós...

Por MT / Rita Foelker – 14/11/13

Alguns dentre vós, absorvidos pelas questões imediatas da vida terrena e verificando os dramas que se espalham por toda parte, dirigem suas questões ao Criador, mas, sem respostas simples e fáceis, entregam-se à descrença. As imagens chocantes de crianças desnutridas em solo africano lhes inspiram piedade, embora a esta nem sempre se siga qualquer ação no sentido de minorar o sofrimento, sequer, de um próximo mais próximo, daquele que, frequentemente, adormece dia a dia sob o mesmo teto.

Mas as razões que procuramos podem ser compreendidas a partir de um ponto de vista mais elevado. Eis que essas pessoas, crianças e adultos a quem hoje faltam os mínimos meios de manutenção da vida carnal, assim o decidiram, por impositivo da própria consciência, escandalizados por, noutras oportunidades, terem aviltado, malbaratado, comercializado, não uma ou algumas, mas vidas humanas em grande número.

Então, tende piedade desses seres em dificuldades amargamente suportadas, mas tende uma piedade esclarecida, consciente e, sobretudo, ativa. O sofrimento na Terra só pode ser reduzido pela decisão e atitude das criaturas que, com determinação e bom sentimento, inteligentemente começarem, cada qual, a olhar por lentes da caridade para aquele ser que, a cada instante, as divinas oportunidades colocam mais perto de si próprios, sem que sequer necessitem dar um passo e, muito menos, atravessar um oceano.



quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Ainda tentando ser perfeito(a)?


CURTA LEITURA ESPÍRITA é um canal de relacionamento entre os colaboradores da revista Leitura Espírita e os seus leitores, que objetiva enviar, via email, pequenos textos de conteúdo espírita, inéditos e edificantes, nos mais diversos estilos (crônica, conto, ensaio, crítica, resenha, reflexão...). Se você está cadastrado, já deve estar recebendo nossas mensagens. Esperamos que você curta. Para conhecer a revista, clique aqui.

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

A importância de considerar diferentes perspectivas

Por Rita Foelker
– Texto inédito

Há sempre uma multiplicidade de perspectivas para cada fato, cada situação, cada ato. Um modo de verificar isso é observar a maneira como pessoas diferentes contam algo que aconteceu. Ou ver o mesmo acontecimento ser noticiado por diferentes telejornais.

A perspectiva altera a percepção das coisas, sendo um aspecto crucial do que se considera conhecimento. A filosofia do conhecimento a enfrenta como um problema interessante. Alguns filósofos – os relativistas – dizem que tudo, em termos de conhecimento, é perspectiva. Nada existe, além dela. Já os essencialistas acreditam que as coisas são algo, em si mesmas, independentes de nossa perspectiva. Mas aqui não vou teorizar sobre a perspectiva, apenas reconhecer que ela existe e que não escapamos dela, nem em considerações teóricas, nem na vida prática.

Na vida prática

Em nosso cotidiano, a percepção da perspectiva é importante.

Primeiro, compreendendo que aquilo que pensamos ou acreditamos ser verdade, é parte da nossa perspectiva pessoal. Não é uma verdade obrigatória para todos.

Depois, valorizando o direito do outro, de ter a sua própria perspectiva, opinião ou apreensão das coisas. Nosso modo de pensar e de ver não é gratuito, ele tem uma história dentro de nós, desde outras encarnações até a nossa educação e o meio em que vivemos. O do outro, idem.

E, enfim, percebendo que a perspectiva influencia nosso humor e nossas ações. Segundo o filósofo estoico Epicteto, “as pessoas ficam perturbadas, não pelas coisas, mas pela imagem que formam delas”...

Mas, se há tantas perspectivas quanto seres conscientes, quais delas devem ser consideradas primordiais? Em minha opinião, duas:

A perspectiva do outro. Numa situação específica, envolvendo outra pessoa ou um grupo, além da nossa própria, é importante buscar entender a perspectiva do(s) outro(s). Não vivemos sós e o que dizemos e fazemos afeta pessoas, em torno de nós. Num diálogo, há duas ou várias perspectivas, mas só será realmente um diálogo se todas ou a maior parte delas for considerada. Caso contrário, teremos apenas um conjunto de monólogos.

Além disso, a consideração da visão do outro também repercute no resultado do diálogo e nas ações subsequentes.

A perspectiva do eu mais elevado. A segunda é a perspectiva do Eu superior, que Paul Brunton chama de “eu mais elevado”, o que bem representa a ideia de observar tudo “do degrau de cima”, de um ponto de vista mais alto, amplo e abrangente. Representa também o ponto de vista do nosso “eu melhor”, daquilo que almejamos como meta de melhoria pessoal e espiritual.

De fato, perante cada situação, temos uma gama de possibilidades de agir, da mais egoísta à mais generosa, da mais explosiva à mais paciente, tudo isso, dentro de nosso espectro evolutivo. Agir com maior bondade e perdão, com maior compreensão e serenidade, dentro desse espectro evolutivo, é agir com nosso melhor, cumprindo o nosso propósito na existência. Segundo Brunton, “o estudante precisa ir ao encontro de cada experiência com a sua mente, lembrando seu relacionamento com o seu eu mais elevado e, consequentemente, o propósito mais elevado de todas as experiências. Nunca deve esquecer a aventura na busca da identidade e da consciência, que a vida é.”

quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Só um ego se incomoda com outro ego

Por Rita Foelker – Para o site FEAL

“Teu crítico é que te faz crescer.[1]” Nesta afirmação, o médico e professor espírita Décio Iandoli Jr. faz pensar na crítica, no seu melhor sentido. Mas seria, ela, apenas a chamada “crítica construtiva”, aquela que é feita no intuito de acrescentar, aprimorar?

Vou defender aqui que o conjunto das críticas que constroem pode ser bem maior que o conjunto das críticas feitas com objetivo construtivo. Pois a construção não depende simplesmente de como ela é feita, mas principalmente de como é recebida e aproveitada.

Uma indicação disso se encontra em Provérbios 9:8: “Não repreendas o escarnecedor, para que não te odeie; repreende o sábio, e ele te amará.” Ou seja, na situação de ser criticado, alguém arrogante se aborrece, imagina-se acima da crítica, permanece onde está e nada aprende. Mas a pessoa que compreende o valor do aprimoramento recebe de boa vontade e agradece o crítico, por haver permitido agregar melhorias a sua realização. Por ter tido a chance de pensar melhor e obter um resultado melhor do seu esforço.

Olhando por esse lado, mesmo que uma crítica chegue meio “torta”, pareça indevida ou imerecida, isso não quer dizer que não seja útil. Ela pode nos alertar para algo que não percebemos, para prestarmos mais atenção a aspectos relevantes. Mas isso somente se, no momento exato, esquecermos o ego e nos lembrarmos de usar a humildade que abre a mente e os ouvidos. Só o fato de contar com uma perspectiva diversa pode ser um benefício.

E se alguém argumentar contra, o diálogo pode ser um modo de checar seus próprios argumentos e fortalecê-los.

Claro que, se colocarmos o ego na frente, não conseguiremos ter lucidez e encontraremos um meio de disputar razões com nosso crítico. Mas inteligentemente colocando-o no seu devido lugar, podemos usar aquele momento pra evoluir.

Houve certa vez uma conversa com meu filho, sobre os papéis dos vilões na literatura e cinema. Sem o vilão, seria difícil desenvolver a trama. O vilão existe para o herói poder mostrar quem ele é. Quando o herói responde à ação ou provocação do vilão, ele usa seus poderes, sua inteligência, demonstra as suas qualidades e é confrontado por suas fraquezas. Isso o leva frequentemente a encarar circunstâncias e superar-se, encontrando capacidades ignoradas para vencer o desafio. Encontrar resistência pelo caminho é um jeito de nos fortalecermos e adquirir mais segurança.

De fato, a crítica recebida positivamente pode ser um meio de trazer à tona nosso melhor potencial, ainda adormecido. Não importa de onde veio, com que intenção. Isso mesmo, uma crítica pode não ter sido construtiva na sua origem, mas ainda pode construir.




[1] O trecho pertence ao texto “Nem tanto ao mar, nem tanto à terra”, postado no blog Portal Espiritualista. Disponível em http://migre.me/g1bns

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Reencarnação é castigo?*

Há quem pense que aqui retornamos em razão de nossos erros cometidos em vidas passadas

Por Rita Foelker, para revista Leitura Espírita



A reencarnação nos proporciona tempo na Terra, um corpo físico e um meio onde nos desenvolvemos de muitas maneiras e podemos atuar. A chegada de um bebê é geralmente celebrada pelas famílias, com alegria e esperança.
Ao reencarnarmos, somos introduzidos num lugar diferente, não sem problemas e desafios, mas também repleto de belezas e possibilidades. Mas há quem pense e diga que reencarnação é pena, castigo, e que aqui retornamos em razão de nossos erros do passado, para sofrer pelo que fizemos outras pessoas sofrerem.
Não é esta a ideia que se depreende dos textos espíritas fundamentais, aqueles que formam a base da compreensão espírita das coisas, deixados por Kardec para nosso estudo e esclarecimento.

Evoluir com liberdade

“A reencarnação é a volta da alma ou espírito à vida corpórea, mas em outro corpo especialmente formado para ele e que nada tem de comum com o antigo”. Eis o que lemos em O evangelho segundo o espiritismo. Se a reencarnação é volta, significa que é preciso já termos encarnado uma vez, para poder reencarnar. Por que, então, encarnamos pela primeira vez, se ainda não cometemos nenhuma falta para sermos punidos?
A resposta vem de O livro dos espíritos, tratando do “Objetivo da encarnação”: “Deus lhes impõe a encarnação com o fim de fazê-los chegar à perfeição.” Dizer que a encarnação é algo imposto, significa dizer que não é uma alternativa ou resultado de nossa conduta, mas que todos os espíritos passam por ela obrigatoriamente. E em O evangelho segundo o espiritismo, Kardec refaz a pergunta: “É um castigo a encarnação e somente os espíritos culpados estão sujeitos a sofrê-la?” A resposta do espírito São Luís não deixa dúvida: “A passagem dos espíritos pela vida corporal é necessária para que eles possam cumprir, por meio de uma ação material, os desígnios cuja execução Deus lhes confia. É-lhes necessária, a bem deles, visto que a atividade que são obrigados a exercer lhes auxilia o desenvolvimento da inteligência. Sendo soberanamente justo, Deus tem de distribuir tudo igualmente por todos os seus filhos; assim é que estabeleceu para todos o mesmo ponto de partida, a mesma aptidão, as mesmas obrigações a cumprir e a mesma liberdade de proceder. Qualquer privilégio seria uma preferência, uma injustiça.”
Obedecendo à Lei de Justiça, todos recebemos as mesmas oportunidades de desenvolvimento da inteligência, por meio da encarnação, colaborando também com a obra da Criação. Mas trata-se também de oportunidade de exercício da liberdade. Pois continua São Luís. “A encarnação para todos os espíritos, é... uma tarefa que Deus lhes impõe, quando iniciam a vida, como primeira experiência do uso que farão do livre-arbítrio.” E logo, passamos a experimentar as consequências de nossa liberdade de escolha, adiantando ou atrasando nossa caminhada evolutiva.
É nesse contexto que aparece, na própria resposta de São Luís, uma referência a “castigo”, ao afirmar que “os [espíritos] que usam mal da liberdade que Deus lhes concede retardam a sua marcha e, tal seja a obstinação que demonstrem, podem prolongar indefinidamente a necessidade da reencarnação e é quando se torna um castigo.” Fica então claro que é a repetição indefinida das lições, a demora no aprendizado, que acaba constituindo uma espécie de punição mas, sempre, resultante das próprias escolhas e ações do espírito em questão, sem intervenção de um Deus punitivo.
O comentário de Kardec reforça esta compreensão: “Para o espírito do selvagem, que está apenas no início da vida espiritual, a encarnação é um meio de ele desenvolver a sua inteligência; contudo, para o homem esclarecido, em quem o senso moral se acha largamente desenvolvido e que é obrigado a percorrer de novo as etapas de uma vida corpórea cheia de angústias, quando já poderia ter chegado ao fim, é um castigo, pela necessidade em que se vê de prolongar sua permanência em mundos inferiores e desgraçados. Aquele que, ao contrário, trabalha ativamente pelo seu progresso moral, além de abreviar o tempo da encarnação material, pode também transpor de uma só vez os degraus intermédios que o separam dos mundos superiores.”

Não existem exceções

Mas mesmo aqueles espíritos que seguiram desde o início o caminho do Bem necessitam reencarnar? Kardec fez esta pergunta aos espíritos, que responderam que “todos são criados simples e ignorantes e se instruem nas lutas e tribulações da vida corporal. Deus, que é justo, não podia fazer felizes a uns, sem fadigas e trabalhos, conseguintemente sem mérito.”
Há outro propósito ainda, na reencarnação: “o de pôr o espírito em condições de suportar a parte que lhe toca na obra da criação. Para executá-la é que, em cada mundo, toma o espírito um instrumento, de harmonia com a matéria essencial desse mundo, a fim de aí cumprir, daquele ponto de vista, as ordens de Deus. É assim que, concorrendo para a obra geral, ele próprio se adianta.”
Fica então a pergunta sobre as razões de nosso sofrimento nesta vida e a razão pela qual algumas pessoas parecem destinadas a sofrerem mais que outras. Os espíritos disseram a Kardec que sofremos muitas vezes pelas nossas imperfeições, não pelo que fizemos noutro momento e lugar. “Quanto menos imperfeições, tanto menos tormentos. Aquele que não é invejoso, nem ciumento, nem avaro, nem ambicioso, não sofrerá as torturas que se originam desses defeitos.”
O que se verifica, então, que a causa do sofrimento está em nós mesmos, em nosso modo de encarar a vida e os desafios, de nos relacionarmos com as pessoas e com a Natureza.

Reconstruindo relacionamentos

De fato, a vida é uma dinâmica, que não leva em conta apenas o que nos acontece, mas como nós reagimos àquilo que nos acontece, e que não pode ser traduzida num esquema simplista de prêmio e castigo.
A reencarnação é um processo que envolve muitos fatores, muitas decisões, muitas emoções e sentimentos que se modificam. O tempo que nos é dado sobre a Terra não é um presente pronto para usar, ele é mais um quebra-cabeça, um jogo de montar. Temos a sensação de que ele às vezes sobra, às vezes parece faltar, mas o fato é que podemos aprender a utilizá-lo tornando nossa vida mais satisfatória ou mais difícil.
Reencarnamos para progredir intelectual e moralmente, desenvolver amor, compaixão, solidariedade, tolerância, paz interior, paciência e outras virtudes. E para cumprir uma tarefa no Universo.
Antes de reencarnarmos, refletimos e, com a ajuda de espíritos mais sábios, traçamos um plano, escolhemos o que queremos desenvolver dentre as nossas muitas necessidades, o que pressupõe um cenário específico. Um meio social. Uma condição física particular. Por isso, algumas pessoas nascem com severas limitações materiais, mas que fazem parte do seu programa evolutivo, da sua proposta de se melhorarem em determinados aspectos. No entanto, a par das condições físicas, financeiras e do meio social desafiador, cabe a cada um de nós, com seu livre-arbítrio, escolher como vai lidar com as situações que encontra, com fé e esperança ou com desânimo, com aceitação ou ressentimento, em paz consigo e com a vida ou, então, em permanente conflito, lembrando que é nas situações-limite, nas dificuldades, que somos incentivados a praticar tudo aquilo que aprendemos e construímos como qualidades de nosso Ser imortal.
Nas muitas reencarnações, reconstruímos relacionamentos que, durante séculos, foram vivenciados em ciclos de vingança, entre ódios e ressentimentos. Não se trata de uma mecânica da lei, simplesmente, mas de um desejo e uma necessidade dos espíritos envolvidos. Ao renascer, somos, então, presenteados com o esquecimento do passado, que facilita a reaproximação de desafetos de outras existências, sem tantas prevenções e reservas, numa nova chance de desenvolver bons sentimentos recíprocos, apagando mágoas. Essas pessoas se encontram hoje próximas de nós, entre nossos amigos, colegas e familiares. E cada vez mais, para viver bem com o próximo, num mundo que chega mais perto de nós a cada dia, graças à tecnologia, vai se fazendo necessário compreender melhor o todo da vida, não apenas nosso pedacinho, nossa tarefa, nosso quadrado.
Então vemos cada vez mais pessoas buscando um sentido para que o viver seja mais que nascer, crescer, estudar, trabalhar, procriar e morrer, que se expande nas palavras de Kardec: “Nascer, morrer, renascer ainda e progredir sempre, tal é a lei”.
Pode parecer que estamos nos esquecendo da chamada “lei de causa e efeito”. Mas ainda existem as consequências naturais de nossos atos e condutas, o que não existe mais é a ideia de que a causa seria um ato infeliz cometido numa vida e, o efeito, a punição posterior.
Segundo o músico e compositor Herbie Hancock, seguidor de uma doutrina reencarnacionista, o budismo, “o maior objetivo de um ser humano é poder entender o que está acontecendo, se é banquete ou fome, se são coisas agradáveis ou desagradáveis, pegar essas coisas e, de alguma forma, transformá-las em algo de valor.” Um exemplo disso pode ser encontrado com a terapeuta ocupacional estadunidense Christina Stephens, que sofreu uma amputação da perna e construiu para si mesma uma prótese com blocos de Lego.
No final de sua existência terrena, a alma se autoavalia, percebendo o que aprendeu e superou e o que ainda falta desenvolver. E então, noutro tempo, noutro projeto, irá recomeçar em nova encarnação.

Para saber mais:
- Americana constrói uma prótese de perna feita de Lego para si mesma. Por Carolina Vilaverde para o blog da Revista Super Interessante, 02/07/13. http://abr.io/IuYL

Reencarnação e comprovação
Desde o século 19 há importantes pesquisas sobre reencarnação entre estudiosos que não são somente espíritas. Há importantes resultados que a confirmam. Em 1910, foi publicada a primeira edição de As vidas sucessivas, de Albert de Rochas, contendo importantes evidências das vidas anteriores. Recentemente, cientistas como Ian Stevenson e Brian Weiss defendem a teoria reencarnacionista, que já é aceita há milênios pelos seguidores do hinduísmo, jainismo, budismo, entre outros, e presente na filosofia de Sócrates e Platão (séc. 5 a. C.).
Muitos argumentos contrários à reencarnação são bem fracos. Cientistas apontam como falha da tese reencarnacionista o fato da população do mundo ter aumentado. Segundo o blog Hypescience (A realidade da reencarnação, postado em 27/04/09), “por volta de 1800 havia apenas 1 bilhão de pessoas no mundo. Agora estima-se que estejamos perto dos 7 bilhões. De onde as novas 6 bilhões de almas surgiram nos últimos 200 anos? Será que nossos ancestrais tinham seis almas adicionais dentro deles?” Esse argumento desconsidera a população desencarnada que também participa da humanidade terrena e, mesmo, as migrações entre planetas.
“Outra questão é: por que há tantas pessoas no mundo que dizem serem as reencarnações de pessoas famosas? Afinal, nos dias de hoje, há várias Cleópatras, Joanas D´Arc e muitos Napoleões e, com certeza, mais de um Jesus.” Que significa? Que há pessoas equivocadas, acreditando que são reencarnações de famosos. Imaginação e crença pessoais não invalidam os casos reais de reencarnação e, muito menos, a própria reencarnação. (Redação)
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*Texto publicado originalmente na Edição 14 da Revista Leitura Espírita, de Julho/Agosto 2013.

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Seguir o fluxo ou nadar contra a corrente?

Tudo está fluindo para o seu melhor e para a minha melhoria...

Por Rita Foelker - Texto inédito

Seguir o fluxo. Nadar contra a corrente. Eu já ouvi as pessoas defendendo as duas coisas.
Em “nadar contra a corrente” parece haver algo de heroico, uma afirmação da vontade, que aumenta a satisfação de realizar o que se deseja. Superar as circunstâncias adversas.
Em “seguir o fluxo” parece haver sabedoria, tranquilidade, aceitação e percepção de que as coisas precisam amadurecer para frutificar.
Eu não tenho dúvida de que há um fluxo, um momento propício para cada coisa acontecer e que isto está além da minha possibilidade de determinação e controle.
Por outro lado, embora não acredite em “nadar contra a corrente” das leis universais, sei que tenho muito que superar – as minhas fragilidades, os meus traumas.
E que as circunstâncias aparentemente tentam me refrear, podendo levar a pensar que devo lutar contra elas. Mas que também é uma questão de interpretação pois, como disse Osho: “Aqueles fortes ventos que batem firme não são realmente inimigos. Eles ajudam você a integrar-se. Parece até que vão desenraizá-lo, mas, ao lutar com eles, você se enraíza.”[1] Ora, preciso me fortalecer. Por isso, sei que, se não reafirmar sempre aquilo que quero, que é meu ideal, se deixar simplesmente “rolar”, provavelmente vou me desconcentrar, perder-me nos meus labirintos internos, deixando passar oportunidades, ignorando as inspirações e intuições. Não se trata, porém, de lutar contra as circunstâncias e, sim, de compreendê-las, ver além delas. Alterá-las, se for o caso.
Seguir o fluxo também é diferente de abandonar-se à correnteza, de largar tudo e apenas esperar. Entendo que a determinação e o foco precisam existir, sobretudo quando não parece muito claro que tudo está fluindo para o seu melhor e para a minha melhoria – porque está, mesmo que ignoremos. Neste planeta onde vivemos no espaço-tempo, as coisas podem ter alguma demora. Então foco, atenção e determinação tornam-se importantíssimos, assim como a sinceridade no desejo de automelhoria.
Eis onde entra o semear e o colher. Se todos os dias plantarmos uma semente na forma de ato, palavra ou pensamento, em favor daquilo que esperamos realizar, a colheita chegará. E isto, sendo determinação, foco, atenção (e também autossuperação, em muitos casos), não significa nadar contra a corrente das leis universais. Significa enxergar além das circunstâncias visíveis e realizar os ajustes necessários, primeiro em nós, depois em torno de nós. Significa depositar nossa fé no fluxo da vida lembrando, como diz Aymará, que a energia se move em círculos.
Eis onde entra a confiança. Se permanecermos serenos (se conseguirmos isso) vamos perceber que, em determinado ponto, parece que os acontecimentos se apressam, o vento enfuna a vela e tudo se encaixa de um modo que, às vezes, sequer imaginamos e de um jeito muito melhor do que poderíamos supor.
Só não se esqueça de que há atitudes que, quando as adotamos, são como “fechar a torneira”. Mas isso fica, talvez, para outro texto...


[1] Se você tem comichões ao ler o nome de Osho, siga o conselho de Kardec: “Julgamos os espíritos pela sua linguagem e as suas ações. As ações dos espíritos são os sentimentos que eles inspiram e os conselhos que dão.” (O livro dos médiuns, item 267, 2º)

quarta-feira, 14 de agosto de 2013

Falsos perfis na prática mediúnica*

Um importante aspecto das comunicações de espíritos é determinar sua autenticidade

Por Ariane de Assis Jordão

De acordo com notícia publicada pelo portal IDGNow, no segundo semestre do ano passado, o Facebook admitia ter mais de 83 milhões de perfis falsos.
Nem todos são mal intencionados. Algumas contas são duplicadas. Há também criação de perfis indevidos – para animais de estimação, por exemplo. Mas o número não deixa dúvidas de que eles podem ser encontrados a qualquer momento, pelas redes sociais.
O mundo virtual permite o crescimento do número de casos, porque facilita a veiculação de imagens e textos sem comprovação de autenticidade das informações. Não se sabe se a foto de perfil é mesmo do titular da conta e, muitas vezes, só poderia saber quem o conhecesse pessoalmente. Também é comum encontrarmos frases com falsa autoria atribuída. Ou uma mesma frase, atribuída a autores diferentes.
Os perfis falsos e autorias duvidosas já estavam presentes nas considerações de Kardec perante a prática mediúnica. A questão da autenticidade de informações e de determinação da verdadeira identidade do autor de uma comunicação mediúnica está presente desde os primórdios das reuniões espíritas.
Allan Kardec considerou a identificação dos espíritos uma das questões “mais controvertidas” da prática mediúnica e analisou as razões, tanto de encontrarmos falsas comunicações, como dados falsos em comunicações mediúnicas legítimas. Vejamos então as orientações que ele nos deixou, a esse respeito.

Espíritos podem se enganar

Um primeiro caso de informações equivocadas provenientes do mundo espiritual ocorre quando os próprios espíritos estão enganados.
A percepção de sua situação no mundo espiritual está relacionada à evolução alcançada. Suas ideias retratam seus conhecimentos e a amplitude do seu entendimento das questões que aborda. Quando é inferior, ainda não totalmente desmaterializado, um espírito conserva as ideias que tinha na Terra e as utiliza para se expressar. Alguns acreditam continuar encarnados, por não terem percebido a transformação da morte física pela qual passaram.
Todo sofrimento após a morte é de natureza moral e não reflete uma condição externa, mas da própria consciência em desalinho. Se suas crenças, porém, envolviam a existência de um céu ou de um inferno, poderão dizer que ali se encontram, mesmo quando sabemos que tais locais físicos de recompensas e de punições futuras não existem.
Tais espíritos, que fornecem informações incorretas, podem não ter a intenção de nos enganar, estando, eles próprios, equivocados, o mesmo podendo ocorrer no que diz respeito a ideias, filosofias e eventuais revelações que eles nos ofereçam.
Como lidar com tais situações? É importante não ter pressa em aceitar como verdadeiro, mas primeiro submeter ao crivo da razão, aquilo que chega pela via mediúnica. É comum que comunicações de espíritos inferiores acabem se contradizendo entre si, ou que tais espíritos contradigam a si próprios, na mesma mensagem ou na continuidade dos contatos mediúnicos.
Os espíritos não pensam todos da mesma maneira, nem têm a mesma visão sobre as coisas de que falam, porque há diferentes degraus na escala evolutiva onde se localizam. E mais, segundo Erasto orienta em O livro dos médiuns: “Podendo manifestar-se Espíritos de todas as categorias, resulta que suas comunicações trazem o cunho da ignorância ou do saber que lhes seja peculiar no momento, o da inferioridade, ou da superioridade moral que alcançaram. A distinguir o verdadeiro do falso, o bom do mau, é a que devem conduzir as instruções que temos dado. Cumpre não esqueçamos que, entre os Espíritos, há, como entre os homens, falsos sábios e semissábios, orgulhosos, presunçosos e sistemáticos.”
Assim, afirma Kardec em O livro dos médiuns que, “para se compreenderem a causa e o valor das contradições de origem espírita, é preciso estar-se identificado com a natureza do mundo invisível e tê-lo estudado por todas as suas faces”.

Espíritos podem querer nos enganar

Diferente é o caso dos espíritos que buscam nos confundir ou enganar deliberadamente, que Kardec chama de “mistificadores”. Mistificar é iludir, fazer acreditar numa mentira.
Nenhum médium, por mais experiente que seja, pode considerar-se isento de mistificações e os bons médiuns têm consciência disso, sendo modestos e não se considerando infalíveis.
As razões são várias, muitas vezes de ordem particular, envolvendo um espírito e uma pessoa ou grupo específico. Outras vezes, a própria atitude do grupo ou médium dá ensejo a tais ocorrências.
Uma das causas apontadas em O livro dos médiuns para as mistificações é o abuso da faculdade, ocasionado pelo entusiasmo de principiantes em obter muitas comunicações, a todo momento, visto não estarem os espíritos à sua disposição. A recomendação é desenvolver uma disciplina de trabalho, com dias e horas determinados para o exercício, “porque assim se entregarão ao trabalho em condições de maior recolhimento e os espíritos que os queiram auxiliar, estando prevenidos, se disporão melhor a prestar esse auxílio”. (O livro dos médiuns, item 217).
Outra causa de mistificação é a insistência em obter comunicações de um espírito determinado. Ignorando que esta comunicação nem sempre será permitida ou possível, forçar a obtenção dá margem à ação dos mistificadores, aos quais pouco ou nada interessam aspectos éticos ou a verdade.
Quando houver suspeita de ocorrência de mistificação, Allan Kardec sugere que se façam perguntas aos espíritos, pois que “raramente suportam a prova das perguntas feitas com cerrada lógica, por meio das quais o interrogante os leva aos seus últimos redutos” (O livro dos médiuns, item 287).
A orientação para o caso de um componente de um grupo encontrar-se numa situação dessas, é de que os membros sejam avisados e fiquem alertas. “Se enérgica resistência o não levar ao desânimo, a obsessão se tornará mal contagioso, que se manifestará nos médiuns, pela perturbação da mediunidade, e nos outros pela hostilidade dos sentimentos, pela perversão do senso moral e pela turbação da harmonia” (O livro dos médiuns, item 340).
Uma pergunta de Kardec aos espíritos superiores merece nossa atenção: “Por que permite Deus que pessoas sinceras e que aceitam o espiritismo de boa-fé sejam mistificadas? Não poderia isto ter o inconveniente de lhes abalar a crença?” Eis a explicação: “Se isso lhes abalasse a crença, é que não tinham muito sólida a fé. Os que renunciassem ao espiritismo, por um simples desapontamento, provariam não o haverem compreendido e não lhe terem atentado na parte séria. Deus permite as mistificações, para experimentar a perseverança dos verdadeiros adeptos e punir os que do espiritismo fazem objeto de divertimento” (O livro dos médiuns, item 303)
A prevenção dessas situações passa por dois cuidados: a prece sincera e a atenção aos menores sinais da presença de mistificadores. “O primeiro atrai os bons Espíritos, que só assistem zelosamente os que os secundam, mediante a confiança em Deus; o outro prova aos maus que estão lidando com pessoas bastante clarividentes e bastante sensatas, para se não deixarem ludibriar” (Idem).

Médiuns podem se enganar e podem nos enganar

Há “falsos perfis”, também, no contexto dos encarnados. Há pessoas que se passam por médiuns e médiuns que divulgam falsas comunicações. O livro dos médiuns tem um capítulo dedicado aos médiuns interesseiros e às fraudes espíritas, pois segundo Kardec já afirmou e bem sabemos, “tudo pode virar objeto de exploração”. Há casos em que o médium pretende obter ganhos financeiros com sua faculdade, enquanto a diretriz espírita é, conforme o ensinamento cristão, dar de graça o que de graça recebemos. Outras vezes, o ganho é da vaidade ou vantagens pessoais, o que, em qualquer caso, compromete a sua produção mediúnica – se for realmente mediúnica – porque as qualidades morais do médium sempre influenciarão, não apenas as comunicações, mas a qualidade dos espíritos que dele se aproximam.
Há, contudo, médiuns que são instrumentos de espíritos enganadores, sem o saberem. Ou que pensam ser médiuns, quando mais não fazem do que dar vazão às suas próprias ideias, num processo que ficou conhecido nos meios espíritas como “animismo”. De fato, todo médium tem uma papel ativo na comunicação, atuando como um intérprete mais ou menos fiel da comunicação do espírito. Mas pode haver confusão entre o que vem do próprio médium e o que é do espírito comunicante e é isso que precisamos evitar. A falta de conhecimento da mediunidade e das leis do mundo espiritual contribui para que uma pessoa nessas condições permaneça iludida. A humildade, o estudo sério e metódico e o autoconhecimento são os melhores antídotos para estes casos.

Estudar e comparar

Kardec considera todas as comunicações de espíritos passíveis de nos servirem ao aprendizado. Algumas são instrutivas em si mesmas. Outras revelam a situação em que os desencarnados que se encontram, de ignorância ou conhecimento, de paz ou sofrimento moral. Cabe a nós ter calma e critério, não atribuir veracidade a todos os relatos, mas compará-los com os conhecimentos adquiridos nos estudos espíritas, para maior segurança e discernimento.
Além das orientações específicas de Kardec e dos espíritos da Codificação, para cada um dos casos acima, de modo geral, alguns cuidados são essenciais. Por parte do médium, uma constante e sincera busca de autoconhecimento, erradicando as causas do autoengano, o orgulho e a vaidade, que além de prejudicarem sua capacidade de serem medianeiros, aproximam-nos de espíritos inferiores, muitos dos quais são levianos, brincalhões ou, mesmo, mistificadores. "Estudai, comparai, aprofundai. Incessantemente vos dizemos que o conhecimento da verdade só a esse preço se obtém” (O livro dos médiuns, item 301).

ARIANE DE ASSIS JORDÃO é educadora e pesquisadora espírita

Para saber mais:
- Facebook admite ter mais de 83 milhões de perfis falsos. Portal IDGNow, postado em 02/08/2012. http://migre.me/ekNbq
- O livro dos médiuns, de Allan Kardec. Segunda parte, capítulos XXIV, XXVII e XXVIII.

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* Este artigo foi publicado originalmente no Jornal Leitura Espírita, Edição 13, de Maio/Junho 2013.

domingo, 11 de agosto de 2013

A essência do "caminho espiritual"

Por Rita Foelker - Texto inédito

Às vezes, considero importante dizer o que penso sobre um assunto, depois de muito ouvir, ler e pensar sobre ele. Mas esta reflexão começou especificamente nesta madrugada, em uma festa de aniversário, no meio de uma conversa. E veio se completando em meu pensamento, até chegar aqui, onde me sento com o "note" no colo e a transformo em palavras.

Existe uma expressão genérica muito em uso nos meios interessados em estudos e práticas voltados à espiritualidade. É a expressão "caminho espiritual".

Aymará já escreveu sobre isso, em seu texto intitulado "Ir", postado neste blog há algum tempo, em que se lê: "onde quer que o caminhante esteja, entre o Leste e o Oeste, entre o Sul e o Norte, há o ponto central de sua vida localizado em si mesmo, onde ele decide (ou descobre) quem ele realmente é, e a partir daí nada mais ao redor parece o mesmo".

Isso me leva a pensar no caminho espiritual como uma busca de encontro com a sua própria essência espiritual, seus reais objetivos e os valores imperecíveis de vida. Portanto, entendo que o caminho espiritual é basicamente uma procura de nós mesmos, da verdade de cada um e que também encerra uma verdade essencial comum à Humanidade.

Tem pessoas que acham que um caminho espiritual envolve ter um guia encarnado, ingressar em alguma ordem, estudar muitos anos, atravessar iniciações, o que é respeitável como fruto da livre escolha, e mais respeitável ainda se provém de um desejo sincero. Mas não me parece que passar por todo esse processo conduza ao desfecho de um encontro de si mesmo, a algum tipo de auto-iluminação. E, principalmente, não me parece que tenha, como resultado inevitável, alguma transformação íntima real.

A aproximação desse "centro" de si mesmo", a que Aymará se refere, aumenta o sentimento de se estar bem consigo mesmo e com todos os demais seres. Não significa, porém, nos forçarmos a isso. Não se trata de uma adoção de certas práticas superficiais. Não se trata de fingir mudança, mas de observarmo-nos e as nossas relações, cotidianamente, no que elas nos ensinam sobre nós mesmos. E, a partir de então, procurar desenvolver atitudes e adquirir hábitos melhores que os que trouxemos até o presente momento. Creio que isso é caminho espiritual.




Precisamos atualizar a ciência espírita?*

Por Rita Foelker

Muito se conjecturou em torno do “caráter essencialmente progressivo” do Espiritismo, que Kardec consignou em Obras Póstumas, ao tratar da sua constituição. Diz o Codificador: “Por ela [a Doutrina Espírita] não se embalar em sonhos irrealizáveis, não se segue que se imobilize no presente. Apoiada tão só nas leis na Natureza, não pode variar mais do que estas leis; mas se uma nova lei for descoberta, tem ela que se pôr de acordo com esta lei. Não lhe cabe fechar a porta a nenhum progresso, sob pena de se suicidar. Assimilando todas as ideias reconhecidamente justas, de qualquer ordem que sejam, físicas ou metafísicas, ela jamais será ultrapassada, constituindo isso uma das principais garantias de sua perpetuidade.”
Vemos aqui que Kardec refere-se ao progresso da ciência revelando novas leis. Afinal, as leis divinas são a base mais sólida dos princípios do Espiritismo e da análise dos ensinamentos dos Espíritos e nossa compreensão delas é o sustentáculo de uma ampla gama de conhecimentos sobre a vida espiritual e o futuro imortal dos seres humanos.
Vez por outra, no meio espírita, surgem opiniões segundo as quais o Espiritismo precisa de atualização, algumas delas pretensamente apoiadas no seu próprio caráter progressivo. Ora, são os livros de Kardec que precisam de modernização, para se adaptarem ao contexto e linguagem atuais. Ora, é a obra de autores encarnados e desencarnados que surge como se fossem novos ares a ventilar as ideias expostas nos textos sesquicentenários da Codificação. Em artigo publicado sob o título sugestivo de “Como Combater o Espiritismo”, publicado no livro Curso Dinâmico de Espiritismo , o Grande Desconhecido (Ed Paidéia), Herculano Pires já alertava para as mistificações grosseiras provenientes de Espíritos, médiuns e grupos que, pouco afeitos ao estudo das obras fundamentais da Doutrina, surgiam de tempos em tempos com novidades que pareciam ofuscar o brilho suave e perene dos ensinos doutrinários.
Recentemente, uma proposta diferente de atualização surgiu no meio espírita. Em março de 2008, o escritor espírita Luiz Gonzaga Pinheiro, afirmou em entrevista à revista O Consolador, ao ser questionado sobre sua campanha pró-atualização da Doutrina Espírita: “Então, a ideia não é nova. É do próprio codificador do Espiritismo, Allan Kardec, que em Obras Póstumas deixou bem clara a opinião de que a Doutrina deveria ser atualizada a determinados períodos de tempo, através de congressos, sempre se posicionando ao lado da ciência, sob pena de suicidar-se. Como a ciência caminha atualmente a uma velocidade alarmante, daqui a vinte anos corremos o risco de contarmos apenas com a parte filosófica-moral do Espiritismo, pois atualmente boa parte do conhecimento científico lá exposto está errada.”
Ora, e em que consistiria esta atualização? O entrevistado explica: “A Doutrina em sua essência é inatacável. A parte científica é que necessita de reparos, através de notas de rodapé, esclarecimentos e aprofundamentos em outra obra ou de outra maneira que uma comissão multidisciplinar julgar mais conveniente.”

O que é ciência?

Mas será que a ciência espírita necessita mesmo de atualização? Para responder a esta pergunta, necessitamos primeiro entender o que chamamos de ciência.
No artigo “Afinal, pode-se falar numa ciência espírita?”, publicado na Universo Espírita nº 45 e que contou com a participação de Silvio Seno Chibeni, dissemos que “a concepção mais comum de ciência é a de um conjunto de teorias solidamente comprovadas por observações e experiências científicas, cuja autoridade seria inquestionável e cujo progresso ocorreria por acúmulo de conhecimentos. Tal concepção tem sofrido repetidos golpes.” Ou seja, a atividade científica deixou de ser encarada como um bloco monolítico de conhecimentos comprovados para tornar-se fruto de uma atividade humana que se configura de acordo com os grupos que a desenvolvem.
Assim, a ciência é hoje considerada mais como um corpo de conhecimentos falível, que pode precisar ser eventualmente revista.
Thomas Kuhn (1922-1996), um dos pensadores contemporâneos que mudou nossa maneira de compreender atividade científica define a ciência como uma prática consensual de um grupo de cientistas. Segundo ele, toda ciência apresenta um padrão, em seu desenvolvimento, que compreende determinados estágios:
a) pré-paradigmático, onde não há consenso entre os cientistas e não se consegue obter um conjunto consistente de dados científicos;
b) paradigmático, também chamado de ciência normal, quando há um acordo sobre os principais aspectos da teoria, o que permite o avanço da pesquisa e o aumento da sua base de dados observacionais;
c) crise, quando o consenso se desfaz e instala-se o debate entre os cientistas, geralmente em razão da impossibilidade de resolução de problemas da pesquisa baseada nos parâmetros oferecidos pelo paradigma;
d) revolução científica, quando ocorrem mudanças teóricas profundas, cria-se um novo modo de pensar e de praticar ciência, acompanhado de uma nova linguagem que não pode ser entendida por meio do uso do antigo quadro conceitual.
Durante o período paradigmático, ou ciência normal, há amplo consenso entre os cientistas sobre as entidades existentes no universo e sobre o modo como elas se relacionam. Os problemas dignos de serem levados em conta pela comunidade científica também são fruto de um acordo, assim como as formas aceitáveis de encontrar soluções para eles. A falha de um cientista em resolver um problema é considerada um fracasso isolado e não um fracasso do modelo adotado.
Nos períodos de crise, caracterizados pelo amplo desacordo e pela proliferação de teorias rivais, as suposições que antes dirigiam a pesquisa mostram-se incapazes de tratar algumas questões importantes, que passam a ser consideradas como anomalias.
A ciência normal não se propõe a descobrir novidades e é bem sucedida quando não as encontra. No entanto, embora o resultado da investigação seja eventualmente antecipado, alcançar tal resultado pode se constituir numa operação muito problemática que desafia as capacidades dos cientistas. Fenômenos imprevistos são periodicamente descobertos. Eles são produzidos inadvertidamente no “jogo da ciência” e podem contrariar um conjunto de regras explícitas ou implícitas (estabelecidas pelos compromissos do pesquisador). Durante algum tempo, os cientistas podem ignorá-los, mas chega-se a um nível crítico onde as antigas ideias dominantes se tornam insustentáveis, o que pode conduzir à introdução de novas suposições – geralmente incompatíveis com o antigo modelo.
Quando o número e a gravidade das anomalias crescem no domínio de uma determinada ciência e um novo conjunto de suposições ou de padrões que dá conta de explicá-las atinge um grau de consistência suficiente para substituir o outro, pode haver troca de um paradigma por outro.
Isto significa que o antigo modelo está superado por um novo, mais satisfatório. Bem... Isto pode ocorrer com o Espiritismo?
Silvio Seno Chibeni em seu artigo “O Paradigma Espírita”, publicado no site do Grupo de Estudos Espíritas da Unicamp, esclarece: “O exame isento e criterioso da situação mostra de forma inquestionável que o Espiritismo não experimenta, nem jamais experimentou, qualquer processo de acumulação de anomalias, e muito menos em seus pontos essenciais, acumulação essa que constitui, segundo Kuhn, um pré-requisito para o desencadeamento de uma crise, capaz de justificar a proliferação de teorias alternativas, e, eventualmente, a substituição do paradigma. Aproveitamos para notar aqui que, em vista disso, incorreram em erro científico aqueles que, já desde os primeiro tempos, têm desenvolvido suas pesquisas fora do paradigma espírita. Não há razões científicas para essa atitude, que só contribui para a dispersão de esforços tão prejudicial ao avanço do conhecimento, como mostrou Kuhn.”
Não há, portanto, razão para se pensar em necessidade de atualização da ciência espírita. O paradigma espírita, representado por suas concepções metafísicas, suas teorias, sua metodologia e os exemplos de sua prática permanece como diretriz segura de pesquisa para quem deseje praticar a ciência espírita.
Chibeni oferece um segundo argumento em favor desta posição: “A segunda parte de nossa resposta passa pela observação de que, dada a natureza específica do paradigma espírita, não se deve esperar que tenha um dia que ser abandonado ou modificado em seus princípios fundamentais. A razão disso é que, exceto por alguns princípios reguladores abstratos, tais princípios encontram-se muito próximos do nível fenomênico, de modo que, utilizando-nos da nomenclatura filosófica, poderíamos classificar a teoria espírita como essencialmente fenomenológica.(...) Por ser fenomenológica, ela goza de uma alta estabilidade diante do progresso de outras áreas da ciência, havendo atravessado incólume as radicais mudanças de paradigma ocorridas na física nas primeiras décadas de nosso século. (...) Sua confirmação independe totalmente de aparelhos, conforme bem enfatizou Kardec, o que é uma enorme vantagem do ponto de vista epistemológico, pelas razões esboçadas acima. São proposições da mesma classe epistêmica que, digamos, as proposições de que o Sol existe, de que o fogo queima, a cicuta envenena, etc. Notemos que a inferência espírita diante de um fenômeno de efeitos intelectuais não difere em nada das inferências que fazemos a partir dos fenômenos ordinários. Quando, por exemplo, o carteiro traz à nossa casa um papel no qual lemos certas frases, não nos acudirá a ideia de que elas não foram escritas por um determinado amigo, quando relatam fatos, contêm expressões e veiculam pensamentos peculiares e íntimos. Exatamente o mesmo se dá com os variados e abundantes casos de psicografia de que somos testemunhas. Não constitui exagero, pois, afirmar-se que a constatação cuidadosa de uns poucos casos dessa espécie é suficiente para eliminar qualquer dúvida quanto ao princípio básico da Doutrina Espírita, a existência e sobrevivência do espírito.”

Ciência não-espírita do espírito?

“Como se isso não bastasse, a base experimental do Espiritismo incorpora ainda muitos outros tipos de fenômenos, como a psicofonia, a xenoglossia, as materializações, vidência, a pneumatografia e a pneumatofonia, etc. Além desses fenômenos, que formam uma classe específica, a dos fenômenos espíritas, o Espiritismo apóia-se também em inúmeros fenômenos ordinários. Referimo-nos, por exemplo, às nossas inclinações e sentimentos, às peculiaridades de nosso relacionamento com as pessoas que nos cercam, aos acontecimentos marcantes de nossa vida, aos distúrbios da personalidade, aos efeitos psicossomáticos, aos sonhos, à evolução das espécies e das civilizações, etc. Entendemos que a desconsideração desse vasto corpo de evidências a favor do Espiritismo constitui séria omissão por parte de seus críticos e daqueles que tentam fazer ciência não-espírita do espírito.” – conclui Chibeni.
Ou seja, o Espiritismo tem um repertório próprio de fenômenos estudados e de problemas a analisar, uma metodologia própria e eficiente e, graças a Kardec, vêm acompanhados da importante noção de progresso, ou seja, de que o conhecimento não é estanque.
O que Luiz Gonzaga Pinheiro propõe não é uma atualização da ciência espírita, nem do Espiritismo. Como ele mesmo diz, poderíamos acrescentar notas de rodapé, dizendo o que a ciência tem descoberto a respeito dos planetas, da matéria, mas sem que isso redunde em mudança estrutural das teorias espíritas sobre o universo material e espiritual.
Quanto aos conhecimentos de química e astronomia, recordemos que Kardec escreveu muitas vezes levando em conta os avanços da ciência da época, que vivia sob a luz de outro paradigma, e isto não deve diminuir o valor nem a importância do conjunto da obra kardeciana. Afinal, ela é também um testemunho de seu tempo em alguns trechos, sendo permanente quanto aos seus aspectos fundamentais.
Parece-nos pouco fundamentada a opinião de que a ciência espírita se perderá, em vinte anos, se não for atualizada segundo a linguagem da ciência atual. Afinal, a ciência que se faz hoje pode estar desatualizada em vinte anos, enquanto que o Espiritismo poderá manter seu vigor e sua atualidade.
Além disso, falando do caráter progressivo, Allan Kardec se referiu, na “Constituição do Espiritismo”, especificamente a mudanças que atingissem as bases do entendimento espírita da realidade, ou seja, a sua concepção das leis naturais. Ele não se referiu às adequações de nomenclatura, as quais são sempre perigosas, já que os termos de uma teoria nascem dentro dela, para servir aos seus próprios objetivos, e dificilmente podem ser transplantados para outros contextos sem que algo se perca ou desvirtue.
Antes de pensar em atualizar o Espiritismo, é mais importante estudá-lo na profundidade e atenção que ele merece, para poder perceber sua real importância e peculiaridade, como a mais completa e frutífera ciência do Espírito que a Humanidade já produziu.



Kuhn como autor relevante em filosofia da ciência

Apesar de não ter recebido nenhum treinamento formal em história, Thomas Kuhn conseguiu com o seu ensaio em forma de livro transformar radicalmente o cenário mundial da filosofia da ciência e história da ciência. Como disse um de seus raros estudantes de doutorado e um de seus primeiros colaboradores, o historiador da ciência norte-americano John Heilbron, Kuhn “foi o mais influente analista do desenvolvimento científico durante o período final do século 20”.
A tese mais importante e conhecida de A Estrutura das Revoluções Científicas afirma que a ciência não se desenvolve através da obediência rígida a cânones metodológicos, mas, sim, por empreender uma prática convergente e unificada de pesquisa, possível por meio da aquisição de paradigmas. O conceito central da reconstrução da racionalidade científica levada a cabo por Kuhn é o de paradigma. Para ele, o paradigma determina a cientificidade de uma área específica de investigação.”
Segundo Kuhn, devemos compreender paradigmas como “[...] realizações científicas universalmente reconhecidas que, durante algum tempo, fornecem problemas e soluções modelares para uma comunidade de praticantes”. Ou seja, uma das funções mais importantes que o paradigma desempenha é a de engendrar o consenso dentro de uma determinada comunidade científica, delimitando os fatos relevantes a serem investigados, elegendo os métodos adequados de abordagem e prescrevendo as soluções legítimas. (Revista Ciência Hoje, Dezembro de 2002)


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* Este texto foi publicado originalmente na Edição 54 da Revista Universo Espírita, sob o título "A ciência espírita está desatualizada?" 

quinta-feira, 23 de maio de 2013

Poder

Pintura de Anderson Debernardi
Por Aymará/Rita Foelker

Poder é uma palavra que engana. Tende-se a interpretar esta palavra de um modo individualista e isolado, o que é resultado da visão fragmentária do Cosmos e do egocentrismo relativo aos primeiros passos da evolução. Isso quer dizer, enfim, que seres pouco evoluídos pouco entendem de poder e menos ainda sabem aplicá-lo.

O poder é a capacidade de agir segundo a própria vontade para atingir objetivos. No entanto, como tudo na Natureza, ele é uma capacidade compartilhada e interdependente de muitos fatores.

Tal compartilhamento advém do fato de, como seres humanos, sermos uma potência do Universo como as outras, tanto como a água e o fogo, as árvores e os animais, e de estarmos sujeitos ao poder do Criador Supremo que age incessantemente. Há também a ação das inteligências da Natureza, que agem, não por escolha própria, porém atendendo aos desígnios da harmonia que deve reinar entre todas as coisas e seres e que está acima dos desígnios pessoais.

O fato de a razão nos ampliar potencialmente o entendimento sobre essas coisas não necessariamente amplia nosso poder, exceto, vez por outra, o poder compreender e contemplar... E a interdependência inerente não deixa de existir, nem mesmo quando se trata de coisas que aparentemente vão afetar apenas a si mesmo. Mas ela é sempre maior, sem dúvida, quanto mais nossos objetivos e ações influenciam um círculo maior de relações no mundo.

O poder de posse e disposição de coisas materiais é visto pelas inteligências mais adiantadas como o jogo das crianças pequenas. A estas, ele parece, algumas vezes, o único possível, e assim as distrai de seus objetivos maiores. Mas tal poder é sempre limitado.

Permite-se que ele seja um meio de alcançar adiantamento no progresso espiritual e conhecimento de si, que é onde o verdadeiro poder começa a se manifestar. O único poder virtualmente ilimitado é o poder de produzir o Bem. Mas antes de desenvolvê-lo, é preciso compreendê-lo ampla e profundamente.

terça-feira, 21 de maio de 2013

"Vai rolar!"

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terça-feira, 2 de abril de 2013

Lições (não tão sutis) da vida

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